*LRCA Defense Consulting - 31/12/2023
No setor brasileiro de armas leves, munições e acessórios, a realidade que
passou a imperar - à revelia da vontade da indústria, do comércio de
bens/serviços e dos consumidores - é o novo arcabouço de normas legais representado pelos calibres oficialmente permitidos, pelas Portarias 164 e 166, e pela autorização para controle de javalis, cujo último ato foi publicado no dia 27 deste mês.
Em vista das problemas trazidos pelas novas normas, vale lembrar que, no início dos anos 60 do século passado, a Marinha dos EUA popularizou uma "metodologia" que passou a balizar os planejamentos iniciais para qualquer atividade, sempre que persistissem dúvidas sobre o que fazer. Simbolizada pelo acrônimo KISS (keep it simple, stupid!), a expressão significa, em tradução direta e bem ao gosto americano, "mantenha o simples, estúpido!". Ou seja, na dúvida, deve-se priorizar o que é mais simples de ser feito.
Assim, apesar da nova realidade imposta pelo governo brasileiro, algumas atividades "simples" são absolutamente necessárias:
- para o cidadão: continuar a adquirir armas, munições e acessórios para a defesa pessoal, da família e de seus bens;
- para os CACs: continuar a praticar a respectiva atividade nas melhores condições possíveis;
- para as empresas: continuar vendendo seus produtos e serviços, gerando empregos, lucros e divisas.
Para além do que é "simples", caberá à Associação Nacional das Indústrias de Armas e Munições (ANIAM), às federações e confederações esportivas, bem como aos representantes de todos os interessados nas Câmaras Municipais, nas Assembleias Legislativas e, principalmente, no Congresso Nacional, continuar na luta por flexibilizar as medidas relativas a calibres, tipos de armas, habitualidade, localização dos Clubes de Tiro e outras que foram engessadas de forma draconiana nas atuais normas.
Dentro das considerações acima, o primeiro fator a levar em conta é que dificilmente o calibre 9mm deixará de ser restrito neste governo, pois acredita-se que, para ele, esta não seja apenas uma questão técnica, mas sim ideológica. O segundo, é que, independente de ser melhor ou pior que os anteriores, agora existe um arcabouço legal a ser seguido, possibilitando que a "vida" continue, tanto para os cidadãos, como para os CACs e para as empresas. O terceiro, é que a luta continua...
A estratégia antifrágil da Taurus e da CBC
Certamente, não foi por falta de planejamento estratégico, flexibilidade e atenção às oportunidades que a Taurus e a CBC se tornaram duas das maiores empresas do mundo livre em seus respectivos setores.
Além de estarem ampliando vigorosamente a expansão geográfica de suas produções e vendas (EUA, Índia e Arábia Saudita), as duas indústrias, frente à nova situação no País, agiram com oportunidade e decidiram continuar a oferecer aos brasileiros a possibilidade de exercer seus direitos com relação às armas. Como empresas que são, decidiram também continuar a vender seus produtos para o mercado interno não institucional (cidadãos e CACs), tanto por este ser significativo em termos comerciais, quanto por ambas terem uma ligação afetiva e de responsabilidade para com ele.
Neste ponto, vale lembrar o conceito de antifragilidade, que consiste em uma característica pela qual as adversidades, especialmente as imprevistas ou não desejadas, tal como a realidade imposta hoje pelas novas normas, não são superadas apenas por atitudes reativas (que podem ser impensadas, não planejadas e até desastrosas, além de não produzirem muitos resultados positivos), mas pela chamada "aceitação estratégica". Neste caso, aceitar não significa permanecer resignado perante o problema, mas aceitar a realidade tal como ela se apresenta e não como gostaríamos que fosse, entendendo o contexto em torno de um imprevisto no menor prazo possível, aprendendo com isso e tomando as melhores decisões consequentes.
A questão aqui é perceber que certas coisas, depois que acontecem, provocam mudanças tão profundas que não há remédio que não seja se ajustar rapidamente, encarando o indesejável não como um problema, mas sim como uma oportunidade, mediante uma posição proativa e consciente, haja vista que a vida, o trabalho e os negócios seguidamente apresentam fatos novos, inesperados ou não desejados.
Assim, a estratégia antifrágil da Taurus e da CBC, frente à nova realidade dos calibres restritos, foi a de criar um novo calibre para o Brasil: o .38 TPC, que tem 40% mais de energia que o .38 (no limite permitido pela legislação) e potência suficiente para ser usado de forma eficiente na defesa pessoal e nas competições de Tiro Prático (IPSC). Como as duas empresas são as grandes patrocinadoras do esporte e o calibre TPC tem recuo e custos menores que o 9mm, com bons resultados finais, a tendência é que cada vez mais atletas adquiram armas nesse calibre, com ênfase nos atiradores dos níveis iniciais.
Tais considerações também se aplicam aos cidadãos comuns que irão adquirir armas a partir de agora, pois além da potência e do preço, serão armas de calibre permitido, acessíveis a qualquer pessoa habilitada.
É relevante lembrar que a outra opção seria a Taurus e a CBC voltarem-se ainda mais para o mercado internacional, abandonado os cidadãos e CACs que necessitassem de armas mais modernas e calibres mais potentes que o .380. Felizmente, essa opção foi prontamente rejeitada pelas duas empresas.
Ou seja, trazendo o conceito de antifragilidade para um jargão bastante
popular, em menos de um mês após a publicação da restrição dos calibres,
as duas empresas souberam fazer do "limão" a "limonada", e na melhor
forma possível para todos os fins e efeitos.
Em entrevista ao repórter Pedro Pligher, de Money Times, Salesio Nuhs, CEO Global da Taurus, esclareceu a questão. “Houve muitos clientes se queixando de que não poderiam comprar uma G2c por conta do novo decreto”. Com a nova legislação, o calibre 9mm, usado na pistola, ficou restrito. “Mas agora poderão comprar a G2c no calibre .38 TPC”, afirma. Ele cita ainda que a nova munição possui algumas vantagens.
“Qual a grande vantagem desse calibre? Primeiro o recuo, pois é mais efetivo que o .380, mas com muito menos recuo (que o 9mm) e uma energia de impacto grande”, diz Salesio.
“Será um calibre mais barato que o do 9mm, na pistola e na munição”, diz. Segundo ele, "a redução deve ser de 5% em média”. Hoje, uma Taurus G2c 9mm na versão mais barata custa R$ 4.146,00 na loja online da Taurus. No novo calibre, deverá custar por volta de R$ 3.900,00.
- "Pegue um estojo 9 mm Luger, corte cerca de 1 mm do seu comprimento e projete uma carga que não ultrapasse 407 joules de energia. Pronto, você tem um cartucho .38 TPC! Se for para apelidar o 38 TPC, mais justo seria chamá-lo de 9 mm Luger -P. O cartucho faz uso dos mesmos projéteis, tem o mesmo limite de comprimento, apenas está limitado a entregar não mais que 90% do desempenho do 9 mm Luger."
- "Como esperávamos, trata-se de estratégia das empresas envolvidas no projeto (Taurus e CBC) em apresentar uma opção de ferramenta para defesa mais eficaz e que, legalmente, se enquadre como PERMITIDO."
- "A linha .38 TPC contará com uma versão Bonded, equipada com projétil de 124 grains. A promessa é que esse projétil - em disparos diretos - penetre próximo de 14” na gelatina balística calibrada (10%), com expansão de, aproximadamente, 40% de seu diâmetro original, sem perda de massa. Resultados que, se comprovados, podem tornar o .38 TPC uma luz no fim desse túnel para os preteridos dos calibres restritos."
Um outro dado a considerar é que dificilmente as empresas estrangeiras irão adaptar suas armas para o novo calibre brasileiro, dado ao custo, ao mercado de um único país e ao alto valor de uma arma importada, acessível a poucos.
Portanto, esta Consultoria acredita que a estratégia da Taurus e da CBC, além de evidenciar a antifragilidade das duas companhias, possibilitará que cidadãos comuns, CACs e empresas continuem a exercer seus direitos e atividades relativos ao setor, da melhor forma possível dentro da nova realidade.
Com relação às indústrias e lojas, a tendência é que as vendas de armas e munições no mercado interno aumentem de forma significativa a partir de agora, dada à enorme demanda reprimida em todo o ano de 2023, contemplando, principalmente, produtos nesse novo calibre, tão logo estejam disponíveis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário será submetido ao Administrador. Não serão publicados comentários ofensivos ou que visem desabonar a imagem das empresas (críticas destrutivas).