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20 novembro, 2023

O novo governo da Argentina, a questão das armas e a indústria brasileira de armas leves


*LRCA Defense Consulting - 20/11/2023

Em várias ocasiões, especialmente durante a campanha presidencial para a presidência da Argentina, Javier Milei afirmou ser a favor de que os argentinos possam comprar armas livremente, justificando para isso o aumento de incidentes de segurança em algumas áreas do país. Disse também que quer promover uma desregulamentação para compra de armas pelos cidadãos, bem como do mercado legal de armas de fogo, visando proteger o uso "legítimo e responsável por parte da cidadania".

A agora vice-presidente na chapa de Milei, Victoria Villarruel, foi quem liderou as propostas de flexibilização do comércio de armas.

A deputada Victoria Villarruel, nova vice-presidente, é filha do tenente-coronel do Exército Eduardo Villarruel, veterano da Guerra das Malvinas, e é fundadora e presidente da associação civil Centro de Estudos Legais sobre o Terrorismo e suas Vítimas (da sigla em espanhol CELTYV), que equipara os crimes praticados pelos governos militares durante a ditadura argentina com ações de grupos armados contrários ao regime. Villarruel decidiu criar em 2006 sua ONG para atender vítimas de atos dos grupos armados de esquerda nos anos 70.

"É hora de reivindicar aqueles que lutaram contra os grupos terroristas que tentaram instalar o comunismo na Argentina e que hoje estão presos injustamente por uma Justiça enviesada e manipulada pela esquerda”, disse Villarruel, em um evento no mês de setembro. Villarruel tem dito que defende “a memória completa”, que, segundo ela, deve considerar que havia "uma guerra" que colocava militares e forças de segurança de um lado e, do outro, guerrilheiros de esquerda a quem chama de "terroristas".

A vice-presidente Villarruel provavelmente não ficará circunscrita à reivindicação das vítimas de grupos armados de esquerda. O presidente eleito já disse que pretende colocar sob responsabilidade de sua vice as áreas de Defesa, Segurança e Inteligência. Ou seja, no futuro governo Milei, a parlamentar deve responder pelas áreas das Forças Armadas e de Segurança Pública, algo que seria novidade no país, segundo especialistas.

Quando perguntado sobre a possibilidade da liberação do uso de armas de fogo, Milei responde que esta será uma responsabilidade direta de Villarruel. A vice, por sua vez, diz que a legislação deve ser respeitada e rebate a acusação dos adversários de que facilitará a chegada de armas às escolas.

"A gestão de segurança dos últimos 20 anos fez um esforço enorme para demonizar os que usam uniforme e têm a função, por parte do Estado, de proteger os cidadãos, seus bens e sua liberdade".

Possíveis consequências para a indústria brasileira de armamento leve e munições
Em matéria de 2015, o portal Armas On-Line afirmava que a Argentina, pelas suas tradições oriundas de países europeus como Espanha, Itália e Alemanha, sempre foi muito mais bem servida de clubes e associações de caça e tiro, com muito mais atividades do que no Brasil. Aliado ao fato de que, com uma legislação de armas de fogo bem regulada, mas muito mais coerente e inteligente em relação à que impera em nosso país, os argentinos sempre foram muito mais adeptos ao esporte do tiro, com esportistas de muito mais alto nível e com recursos de aquisição de armas e munições muito mais facilitados, com enorme quantidade de estabelecimentos comerciais dedicados ao ramo.

A importação de armas na Argentina também foi um dos pontos fortes para o incentivo à caça e ao tiro esportivo no país, visto que não houve períodos de restrição às importações nem mesmo em épocas economicamente desfavoráveis. Aliás, mesmo durante o período do regime militar no país, a população em geral e principalmente os atiradores esportivos e caçadores nunca tiveram seus direitos cerceados quanto à posse e o uso de armas de fogo.

Realmente, segundo fontes próximas à indústria brasileira de armamento leve, o mercado argentino de armas e munições era gigante. No entanto, essa história mudou ainda em 2015, no governo de Cristina Kirchner, sendo feito na Argentina mais ou menos o que Lula fez aqui em 2023, como pode ser visto no tópico "Legislação para armas de fogo na Argentina".

A se concretizarem as mudanças desejadas por Milei & Villarruel nas normas legais sobre armas e munições no país platino, é razoável supor que a indústria brasileira do setor possa ser amplamente beneficiada, dada à proximidade geográfica e à afinidade entre os dois países. Especialmente a Taurus e a CBC (Magtech) poderão ter maior facilidade de penetração, pois já estão lá há muitos anos e são conhecidas pelos "CACs" argentinos, embora as mais modernas e tecnológicas linhas de pistolas e revólveres da Taurus ainda não estejam ao alcance legal da maioria dos seus cidadãos atualmente.

DFA Defense (pistolas 9mm), IMBEL (pistolas) e Boito (espingardas de caça) também poderão prospectar clientes no país platino. Já as armas longas táticas (fuzis, submetralhadoras, carabinas e espingardas táticas) fabricadas, conforme o caso, por Taurus, CBC, IMBEL, Boito e  Fire Eagle dependerão do nível da flexibilização a ser determinada pelo governo argentino.

Seja como for, se houver uma flexibilização, esta já será muito bem-vinda pela indústria brasileira de armas leves e munições, pois representará mais um potencial e importante mercado - civil e institucional - situado logo após a fronteira brasileira.

A propósito, a última venda institucional da Taurus para a Argentina (do conhecimento desta Consultoria) ocorreu em agosto de 2020, quando, em cerimônia formal, a Taurus entregou 500 pistolas Taurus TH9 para a Polícia da província de Chubut. As pistolas seriam utilizadas por duas divisões da corporação, as Divisiones de Seguridad Rural de toda a província e a División de Investigaciones de Puerto Madryn.

Legislação para armas de fogo na Argentina
As armas de fogo na Argentina são restritas e regulamentadas pela Agência Nacional de Material Controlado (ANMaC) desde o final de outubro de 2015, quando o RENAR (Registro Nacional de Armas da República Argentina) foi substituído pela agência, ambos os órgãos são subordinados ao Ministério da Justiça e Direitos Humanos. 

Para possuir uma arma de fogo, é preciso ser um usuário legítimo. Os candidatos devem: ter 21 anos de idade ou mais, fornecer um atestado médico que certifique que estão fisicamente e mentalmente aptos, completar um curso de segurança, fornecer um meio legítimo de renda e passar por uma verificação de antecedentes. A partir daí, uma licença é emitida e deve ser renovada a cada cinco anos. Uma vez que um usuário legítimo queira comprar uma arma de fogo, ele deve fornecer um local seguro para guardar a arma e uma razão aceitável para querer uma arma de fogo, como coleção, tiro ao alvo, caça, negócios ou autodefesa do lar.

As armas de fogo devem ser compradas através de um revendedor licenciado e registradas na ANMaC. Se uma arma de fogo é herdada, um formulário de novo registro deve ser arquivado. Não há limite para o número de armas de fogo possuídas, desde que sejam armazenadas corretamente. As vendas de munição são registradas, mas ilimitadas.

As autorizações de porte para proprietários de armas licenciadas são extremamente difíceis de obter e exigem que apareçam perante a diretoria da ANMaC para apresentar seus argumentos. As autorizações de porte são renovadas anualmente para reexaminar seu perigo "claro e presente", e a permissão é geralmente revogada imediatamente se esse perigo for removido. Aqueles que lidam com dinheiro, objetos de valor ou em segurança privada podem receber uma permissão de porte de negócios.

Armas acima do calibre .32 são de uso condicional; armas totalmente automáticas são proibidas para civis. Fuzis Longos e rifles semiautomáticos acima de calibre .22 com um carregador não destacável são de uso condicional; rifles totalmente automáticos e rifles semiautomáticos acima de calibre .22 com carregadores destacáveis são proibidos; espingardas semiautomáticas e espingardas com canos entre 380 e 600 mm são de uso condicional; espingardas totalmente automáticas com canos abaixo de 380 mm são proibidas.

No vídeo abaixo, a equipe da Arma Store visitou um grande clube de tiro em Buenos Aires em outubro último, explicando "como funciona o mundos das armas" no país:

 

Bersa - a principal fabricante privada de armas leves
Segundo o Armas on Line, a Bersa foi fundada por volta em 1958 pelos imigrantes italianos Benso Bonadimani, Ercole Montini e Savino Caselli, todos eles engenheiros mecânicos de formação, na localidade de Ramos Mejía, província de Buenos Aires.

Em 1989, a Bersa lança sua primeira pistola em calibre 9mm Parabellum, visando o mercado policial e militar, o modelo 90. Por volta de 1994 um novo projeto denominado de “Thunder” ganha as ruas, oferecendo dois modelos de pistolas, oferecidas desde o calibre .22LR até 0 .380ACP, funcionando no sistema “blow-back” (sem travas de culatra), e também no calibre 9x19mm, denominada de Modelo 90, essa funcionando no sistema de “locked-breech” (culatra trancada).

Em 1990 a Bersa ganhou um contrato para fornecer a nova pistola que viria a ser adotada oficialmente pelas Forças Armadas Argentinas, em substituição às Browning Hi-Power M1935. Essa arma é a Bersa Thunder 9, uma evolução do Modelo 90.

A Bersa é atualmente o maior fabricante privado de armas de fogo na Argentina. Sua produção hoje é bem diversificada, com cerca de 10 tipos de pistolas oferecidas a partir do calibre .22LR, passando pela muito popular Thunder 380 e a série Ultra Compacta fornecida em calibres 9mm Parabellum, 40S&W e 45ACP.

A empresa é conhecida e respeitada pela qualidade de seus produtos, oferecendo muito bom acabamento, estilo, precisão e confiabilidade. Os projetos da Bersa, em sua grande maioria, se baseiam nos mais comumente encontrados na indústria alemã de armas, principalmente da firma Carl Walther, apesar de que não se trata de cópias; existe toda uma engenharia de processo e fabricação envolvida em modificações que são exclusivas do fabricante argentino.

Os projetos das Thunder 22, 32 e 380 são realmente inspirados nos famosos modelos PP e PPK daquele fabricante alemão, sendo que os modelos mais potentes, tais como a Thunder 9 e Thunder 40 lembram, em alguns detalhes, o modelo P88 da mesma casa Walther.

Hoje, a Bersa exporta para diversos países, inclusive para o Brasil, e tem muito boa aceitação no concorrido e extremamente exigente mercado norte-americano, onde está presente com seus Modelos 380 e Modelos 9, através de sua importadora exclusiva Eagle Imports, Inc., de New Jersey. A empresa dedica-se também à fabricação de espingardas de um só cano, monotiro, a partir do calibre 16 até 28.

Após abrir uma nova fábrica, agora na cidade de Kennesaw, no estado norte-americano da Geórgia, a Bersa passou a fabricar pistolas e rifles com a plataforma AR-15. Conhecida como “BAR”, a nova série inclui as pistolas BAR9, disponível no calibre 9 mm Luger, e os fuzis BAR15, compartimentados nos calibres 5.56 NATO e 300 Blackout.

Fabricaciones Militares - a "IMBEL argentina"
A então Dirección General de Fabricaciones Militares (DGFM) de Argentina foi criada pelo governo em 1941 e tem uma semelhança com a nossa IMBEL. Por Decreto 104/2019, a DGFM foi convertida em “Fabricaciones Militares Sociedad del Estado”. Dessa forma, a FM passou a ser regulamentada pela Lei nº 20.705

Empresa de economia mista, é uma das maiores fornecedoras de equipamentos bélicos para as Forças Armadas e Policiais da Argentina, produzindo armas de qualidade e de primeiro nível, além de prover uma linha de armas esportivas para uso civil. A empresa conta hoje com quatro unidades de negócios: Segurança e Defesa, Química e Fertilizantes, Mineração e Petróleo e Metalmecânica e Transportes 


Seus principais produtos são os fuzis automáticos FAL, FAP e FARA (baseados no FAL belga, da F.N.) em cal. 7,62x51mm (7,62mm NATO), pistolas semiautomáticas baseadas no modelo 1911 da Colt em calibre 9x19mm, as submetralhadoras PAM, PAM2 e FMK3, além de carabinas calibre .22LR, uma réplica do fuzil britânico Brown Bess com ação de pederneira, carregadores, acessórios e canos sobressalentes. Além disso, produz pólvora, materiais químicos para uso em indústria bélica, cartuchos para armas curtas, longas e para canhões, rojões para morteiros, granadas, coletes e gás lacrimogêneo, além de liderar ou participar da fabricação de radares, obuses, canhões sem recuo, lança-rojões etc.

Sua linha atual de pistolas semiautomáticas no calibre 9×19 (9mm Parabellum), baseada nas Browning Hi-Power 1935, compreende os modelos MM HP, M 95 CLASSIC, HP DETECTIVE e HP M95 CLASSIC.

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