*Aviation Week, por Jens Flottau e Chen Chuanren - 31/08/2023
A certificação de um tipo de aeronave noutro país é normalmente uma questão menor, embora seja um pré-requisito para iniciar operações no estrangeiro. No caso do 195-E2 da Embraer e da China, a recente decisão da Administração de Aviação Civil da China de aprovar o tipo é muito mais significativa, anunciando a mudança estratégica da Embraer para a Ásia.
O fabricante de aeronaves brasileiro, tal como os seus maiores pares Airbus e Boeing, ainda está a recuperar da pandemia da COVID-19 e está longe dos níveis de produção de que já desfrutava. Além dos problemas que cada OEM enfrenta, a Embraer tem que lidar com problemas específicos da aviação regional e do seu próprio portfólio de produtos. A família E2, uma atualização fundamental da primeira geração de grandes jatos regionais da Embraer, não está vendendo tão bem quanto a empresa esperava em seus habituais mercados ocidentais.
As razões são múltiplas. As cláusulas de escopo nos contratos-piloto nos EUA persistem, impedindo novos pedidos. As frotas regionais em serviço também são relativamente jovens e as transportadoras de baixo custo que operam aeronaves maiores entraram em muitas rotas anteriormente regionais na Europa. Isto significa que a Embraer precisa de novas ideias e novos mercados para melhorar as suas perspectivas.
China e Índia: grandes mercados de crescimento
É aí que a China e a Índia entram em jogo. Se tudo correr conforme planejado pelo CEO da Embraer, Francisco Gomes Neto, os dois países se tornarão grandes mercados de crescimento para suas aeronaves, bem como novos parceiros na produção. Gomes Neto disse estar preparado para instalar linhas de montagem final na China e/ou Índia, desde que garantido o número necessário de encomendas. As empresas de ambos também poderiam se tornar grandes fornecedores, além de realizar trabalhos de montagem.
Mais dicas sobre o futuro da Embraer na região poderão surgir já na próxima cúpula do G20, organizada pela Índia e a partir de 9 de setembro.
Governo chinês pensa claramente que o E2 será útil na aviação civil do país
Na China, a certificação de tipo de aeronave pode ser vista não apenas como um ato administrativo após uma análise da aeronavegabilidade e segurança do tipo, mas também como parte de uma estratégia industrial mais ampla. O governo pensa claramente que o E2 será útil na aviação civil chinesa. Além disso, tanto o E190-E2 – certificado na época do Zhuhai Airshow de 2022 – quanto o E195-E2 são maiores que o Comac ARJ21 e menores que o C919, portanto, não competirão com os produtos fabricados localmente.
“Nossa equipe na China está trabalhando ativamente com clientes em potencial e fazendo bons progressos”, disse o presidente e CEO da Embraer Aviação Comercial, Arjan Meijer. “Existem oportunidades significativas para o E2 na China, que oferece capacidade complementar às aeronaves ARJ21 e C919 indígenas da China. Combinados, eles oferecem opções flexíveis, eficientes e ecológicas para as companhias aéreas chinesas, atendendo à demanda do mercado de transporte aéreo que mais cresce no mundo”, acrescenta.
Durante a visita de estado do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva à China em abril, ambos os governos expressaram apoio às atividades da Embraer e às potenciais vendas de aeronaves na China.
No Paris Air Show, em junho, a Embraer assinou uma carta de acordo com o Lanzhou Aviation Industry Development Group para a conversão de 20 E190Fs e E-Jets E195F de passageiros em cargueiros, com capacidade industrial a ser estabelecida em Lanzhou, capital da província de Gansu.
Não está claro onde ocorrerá a montagem final dos E2, e a Embraer não comenta o número de pedidos necessários para justificar a construção de uma instalação com um parceiro local. Sob uma parceria anterior com a Avic, os jatos executivos ERJ145 e Legacy 650 foram montados em Harbin de 2003 a 2017. Esse empreendimento não teve sucesso, com apenas 45 aeronaves construídas.
O banco de dados Fleet Discovery da Aviation Week Network indica que 62 variantes mais antigas de E-Jets estão em serviço na China, 43 dos E190 menores e 19 dos E195 mais longos. Outros 10 E-Jets estão estacionados e 26 armazenados.
O E2 vem ganhando força na região Ásia-Pacífico. A Embraer garantiu um pedido da Scoot de Cingapura para nove E190-E2 e da SKS Airways da Malásia para 10 E195-E2.
Historicamente, as operadoras chinesas tiveram até 85 E190s (em 2017) e 20 E195s (em 2018) em serviço, junto com 38 MHIRJ (anteriormente Bombardier) CRJ900s (em 2018) e 14 CRJ700s (em 2017), de acordo com dados da frota da Aviation Week Network. A China tem um recorde de 238 jatos regionais em serviço atualmente, em parte como resultado da maior produção do ARJ21.
Grande esforço também na Índia
O grande impulso da Embraer na Ásia não se limita à China. A fabricante está fazendo um grande esforço de marketing na Índia, onde espera vender o transporte militar C-390 e mais aeronaves comerciais, além de firmar parcerias industriais. Mas as condições são diferentes na Índia, onde a Embraer lida com companhias aéreas privadas e com uma intervenção governamental menos direta. Ainda são esperadas compensações industriais para grandes encomendas, como a Airbus e a Boeing observaram recentemente quando assinaram acordos de aeronaves com a Air India, agora uma entidade privatizada.
Dada a situação geopolítica menos controversa da Índia, as potenciais exportações da Embraer de lá para outros países asiáticos seriam presumivelmente mais fáceis de organizar do que a partir de uma base na China. No entanto, a Índia ainda é um mercado pequeno para a Embraer. Seu único cliente lá, a transportadora regional Star Air, opera três Embraer 175 e quatro ERJ145.
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