*LRCA Defense Consulting - 02/11/2022
A eleição de um Presidente de esquerda e francamente contrário ao direito de o cidadão de bem possuir e/ou portar armas, mesmo dentro dos rígidos limites da lei, é realmente um problema para a indústria brasileira do setor de armas leves e munições, haja vista que lhe retira uma parcela das vendas destinadas aos civis, que pode ser expressiva ou não conforme a empresa.
Evidentemente, nesse novo cenário, desde que todos os Decretos do Presidente Bolsonaro sobre o assunto sejam revogados, algumas das cinco empresas brasileiras que produzem armas leves poderiam ser seriamente prejudicadas, já que, até o momento, têm seu direcionamento quase que exclusivo para o mercado interno civil, como é o caso da DFA Defense e da Fire Eagle.
A estatal Imbel, apesar de vir a ser prejudicada, ainda tem o mercado institucional cativo do Exército Brasileiro e a possibilidade de continuar vendendo para alguns órgãos policiais e guardas civis municipais. Caso similar aconteceria com a divisão de armas longas da CBC, que ficaria praticamente restrita ao mercado de segurança institucional (destino majoritário de suas vendas) e à exportação de carabinas Puma e de espingardas.
A venda de munições da CBC seria afetada apenas marginalmente, já que possui unidades produtivas no Brasil, Alemanha e República Tcheca (inclusive uma na Índia em joint venture, que deverá entrar em funcionamento em 2023), além de centros de distribuição no Brasil, Estados Unidos e Europa, o que faz da CBC Global Ammunition a líder mundial em munições para armas portáteis. No Brasil, tem quase 100% do mercado, com foco maior nas Forças Armadas e nas demais forças de segurança.
A Boito, embora venha a ser atingida, ainda terá alguma margem de manobra, haja vista que seu foco principal são armas de caça, embora possua uma linha de espingardas pump, mais direcionada às forças de segurança.
O caso da Taurus Armas
A Taurus Armas domina (em conjunto com as armas longas da CBC) quase 80% do mercado brasileiro de armas leves. Ao longo dos anos, diversas empresas internacionais tentaram aqui se estabelecer, mas todas desistiram frente à insegurança jurídica, aos entraves regulatórios e à política tributária que se abate sobre este setor.
Com orgulho de ser uma empresa nascida e crescida no Brasil há mais de 80 anos, os consumidores brasileiros sempre foram a prioridade estabelecida pela Taurus ao traçar suas estratégias empresariais, mesmo tendo ela uma maior lucratividade no mercado externo. Com isso, apesar de uma demanda externa muito aquecida nos últimos três anos, fez questão de atendê-los primeiro, em detrimento do mercado internacional, onde está a quase totalidade de seu backorder. Este é um dos motivos pelos quais o mercado interno, embora represente, historicamente, somente de 12 a 15% do total de vendas (18,5% no 1S22), contribuiu com cerca de 28,6% da receita operacional líquida (armas & acessórios) do último semestre.
Nesse ponto, é relevante lembrar que o
turnaround da Taurus Armas foi iniciado logo após sua aquisição pela CBC em 2015, sendo
fortalecido e consolidado após a chegada da atual equipe diretiva. Em consequência,
a "virada de mesa" da Taurus aconteceu sob a vigência das normas ainda
estabelecidas pela Lei nº
10.826/2003 (conhecida como Estatuto do Desarmamento), sendo anterior,
portanto, aos decretos emitidos pelo Presidente
Bolsonaro a partir de 2019 e ao próprio Presidente.
A
Taurus vendeu 1 milhão de armas no 1º semestre de 2022. Foram 770 mil
para os EUA e 52 mil para o resto do mundo, no total de 822 mil,
comercializadas em dólar. Para o Brasil foram 186 mil armas,
comercializadas em reais, boa parte delas para os órgãos de segurança.
Nova fachada da Taurus Armas após as ampliações previstas para até 2025 |
Planejamento estratégico firme prevê opções para a empresa
Em
março de 2021, em declaração a esta editoria,
Salesio Nuhs afirmou que "a Taurus tem um planejamento estratégico
muito firme e, evidentemente,
nesse planejamento estratégico, pela natureza de seu produto, são
consideradas possíveis alterações no mercado e nas questões políticas,
tanto
no Brasil quanto nos Estados Unidos, que é o maior mercado da
companhia. O mercado brasileiro é pequeno para a Taurus. Com
isso, essas alterações políticas [as possibilidades, na época, de Lula
concorrer e vencer nas
eleições de 2022, e a ingerência do STF] não mudam os resultados
financeiros da empresa".
Salesio completou dizendo que "Evidentemente, o que pode mudar é a questão do direito do cidadão de possuir uma arma para a legitima defesa, mas isso não chega a impactar financeiramente a empresa".
Em
agosto de 2021, em entrevista ao InfoMoney, o CEO da Taurus foi
bastante claro: “Se tivermos um revés na questão política, o mais grave
será o
cerceamento do direito democrático de comprar arma de fogo. Em 2005
tivemos uma vitória [63,94%] em referendo a favor das armas, que não foi
democraticamente respeitada.”
Em relação aos negócios da empresa,
foi categórico: “É inconveniente ter uma fábrica de armas em um país
anti-armas, mas em resultado isso não nos preocupa. Toda a nossa
produção seria mandada para o exterior se houvesse uma proibição total.”
Em tal cenário,
uma possível queda nas vendas internas poderia ser compensada facilmente
com aumento do esforço de vendas nos EUA e em outros países, como na
Índia a partir de janeiro de 2023, quando a unidade fabril nesse país
entrará em operação.
Para
tanto, entre outras medidas e além da exportação direta de produtos
acabados, o planejamento estratégico da empresa prevê o estabelecimento
de um hub de produção de peças e componentes (kits) no
Brasil, que serão enviados às unidades fabris dos EUA e da Índia, onde
serão utilizados para a montagem das armas que receberão o Made in USA ou Made in India, conforme o caso.
Prevê
ainda a possibilidade de dobrar a capacidade produtiva da fábrica
americana, haja vista que esta tem espaço físico para crescer muito.
Possibilidade similar poderá ser concretizada também na Índia, pois lá
se encontra o maior e mais inexplorado mercado mundial para armas leves,
e a Taurus tem possibilidades reais de passar a ser um dos grandes players desse mercado.
Uma
outra opção possível é a transferência estratégica de linhas de
montagem do Brasil para os EUA e/ou para Índia, assim como já aconteceu
com uma da pistola TS9 e outra da pistola G2c em 2020 para os Estados Unidos, o que pode
ser feito em um prazo curto, se for necessário.
É ainda importante salientar que as
Polícias de todos os tipos, Guardas Municipais e integrantes das Forças Armadas e das Forças
Policiais continuariam comprando armas de calibres superiores, como
faziam até 2018, conforme a legislação específica permitia. A propósito, as
armas de calibres restritos (que recentemente tiveram a venda proibida a CACs pelo
STF) representam apenas 3% do faturamento da empresa, sendo que seus
consumidores, na grande maioria, são dos Estados Unidos.
A nova configuração do Congresso e dos principais governadores
O Partido Liberal (PL), do qual o
Presidente Jair Bolsonaro é integrante, conquistou oito das 27 vagas em
disputa no Senado, formando a maior bancada dessa Casa Legislativa. Na
Câmara, o PL elegeu uma superbancada de 99 deputados – novamente a maior
para o ano que vem.
No total, foram eleitos 43 senadores (53%) e 274
deputados (53%) representando os ideais conservadores.
Em conjunto, o novo Congresso e os governadores de direita que foram eleitos em 14 estados, inclusive nos mais influentes do País (vide imagem), representam a
maior vitória dos ideais conservadores na história do Brasil.
Essa nova configuração política possibilitará ao novo Congresso (com o respaldo dos governadores dos principais estados) rejeitar, aprovar, alterar ou extinguir normas legais de acordo com os interesses da maioria - como o Estatuto do Desarmamento, por exemplo - trazendo ao País um novo e perene arcabouço legal que possa proporcionar uma maior segurança jurídica às empresas, aos investidores e aos consumidores.
Possibilitará também que seja votada e aprovada uma nova "lei das armas", com base no Projeto de Lei n° 2424, de 2022, de autoria do atual Senador Lasier Martins, que visa "alterar os arts. 3º, 4º, 5º, 8º, 23 e 27 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para regulamentar o direito de propriedade de arma de fogo, prever requisitos de idoneidade para aquisição de arma de fogo, definir a quantidade e espécies de armas permitidas à posse e porte, regulamentar o uso de arma para defesa e dar interpretação a artigos da Lei 10.826".
Conclusões
Caso
se imponha esse cenário restritivo, limitando (em maior ou menor grau)
os produtos disponíveis ao mercado interno (armamento, munições e
acessórios), os
grandes prejudicados serão os consumidores brasileiros, tanto os
CACs como os demais cidadãos de bem que terão seu direito à legítima
defesa não respeitado (mais uma vez), enquanto veem criminosos de todo o
tipo se armarem e atentarem livremente contra sua segurança, de sua
família e de seu patrimônio.
De igual forma, também serão prejudicados os milhares de proprietários e trabalhadores nas pequenas fábricas, lojas, clubes e demais empresas do setor atingidas, que poderão perder seus negócios ou seus empregos.
Perderá também a economia de municípios e estados, seja pela diminuição de receita com impostos e divisas, seja por terem que arcar com novos custos sociais e de saúde para com os desempregados.
Quanto
à Taurus, por ser uma multinacional vocacionada para a exportação, bastará colocar em execução o seu planejamento estratégico para a
situação e se voltar, nova e primordialmente, ao mercado internacional,
direcionando para este a maior
parte de seus produtos e/ou
transferindo outras linhas de montagem para as unidades dos EUA e da
Índia.
No entanto, tais restrições e consequências negativas poderão deixar de existir, à revelia da vontade do futuro Presidente, bastando que o novo Congresso Nacional decida votar e aprovar o Projeto de Lei n° 2424, de 2022. Neste cenário, o mercado brasileiro de armas e munições seria integralmente mantido, com todas as consequências positivas decorrentes para o setor, para os investidores e para os consumidores.
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