*LRCA Defense Consulting - 03/01/2021
A primeira parte da presente matéria é um apanhado do que foi publicado em alguns órgãos de imprensa no último mês, editado e colocado em um encadeamento lógico. Seu objetivo é evidenciar a importância das eleições no Congresso para o avanço das normas referentes à posse e ao porte de armas para os cidadãos de bem e para algumas categorias profissionais ligadas à Segurança Pública.
Na segunda parte é feita uma análise sobre algumas das consequências, para a indústria brasileira de armamento leve, das eventuais flexibilizações (ou não) das normas que hoje vigoram.
Definição de rumos
As eleições para o comando das duas Casas do Congresso Nacional, em 1º de fevereiro de 2021, serão cruciais para definir os rumos do governo Bolsonaro para os próximos dois anos. Especialmente a disputa na Câmara dos Deputados é prioridade do Palácio do Planalto.
Na disputa pelo comando da Câmara, os parlamentares devem votar entre duas opções: os deputados federais Arthur Lira e Baleia Rossi. Lira é o candidato do governo Bolsonaro. Ele deve disputar o comando da Casa contra Baleia Rossi, candidato apoiado pelo atual presidente da Casa, Rodrigo Maia, por um grupo de deputados de partidos de espectro ideológico variado e pelos partidos de esquerda PT, PCdoB, PDT, Rede e PSB (exceto o PSOL, por enquanto).
O Governo federal está confiante na vitória do líder do Centrão, Arthur Lira. O motivo de tanto otimismo é a divisão interna de partidos que apoiam a candidatura de Baleia Rossi.
No dia 27 de dezembro, a bancada de Jair Bolsonaro no Congresso pareceu ter chegado a um consenso. Uma das líderes do movimento bolsonarista, a deputada Carla Zambelli, foi às redes sociais para declarar apoio ao deputado Arthur Lira.
A contabilidade de votos, por ora, é claramente feita de forma superficial. O aprofundamento do total de apoio esperado vem sendo trabalhado nos últimos dias e será intensificado na próxima semana. Ou seja, Lira mantém diálogo com líderes partidários e lideranças parlamentares para contabilizar o “voto a voto”, o “nome a nome”, riscar os nomes com quem pode contar, quem não pode contar, e quem é indeciso.
O governo atua junto no processo de articulação. Menos na contagem do “voto a voto” e mais como um fiador. Segundo publicação do jornal O Globo, a articulação política do Palácio do Planalto trabalha com um mapa de 500 cargos federais a serem preenchidos em troca de votos para Lira. Ainda de acordo com o jornal, o próprio líder do Centrão trabalha para dar forma a esse mapa.
A informação foi confirmada pela Gazeta do Povo, mas deputados próximos de Lira dizem que há mais do que 500 cargos. Uma contagem superior a essa virá da reforma ministerial que o governo promoverá. “A reforma ministerial vai acontecer”, afirma um interlocutor do governo, sem bancar, contudo, quando ela ocorrerá. “É cedo para assegurar se as mudanças acontecerão antes da eleição da Câmara. Mas estão sendo alinhavadas”, acrescenta.
Armas
Candidato favorito de Bolsonaro à presidência da Câmara, o deputado Arthur Lira, assim postou no Twitter: “A nova Câmara é aquela que não barra nem libera as chamadas iniciativas radicais. A nova Câmara é aquela que põe todos os assuntos na mesa, que dialoga e chega no entendimento. Com o plenário sempre soberano” escreveu, no dia 21 de dezembro. E completou: “Não é o presidente quem dita o que é discutido. Ele só coordena. Esse é meu pensamento: dar voz a todos.”
Na prática, segundo um órgão de imprensa de oposição governo, esse princípio abre uma avenida para a aprovação de pautas caras ao bolsonarismo, como a facilitação da posse e do porte de armas, barradas por Rodrigo Maia ao longo desses dois anos.
Segundo a revista Época, Arthur Lira é também um apreciador de armas e dono de uma pistola Glock 9mm.
Posse e porte de armas: situação na Câmara e no Senado
A flexibilização do porte de armas, tema defendido por numerosos parlamentares durante a campanha eleitoral de 2018, também não caminhou neste ano.
Na Câmara, o PL 6438/19, que trata da posse e do porte de armas para profissionais de segurança pública, aguarda entrada em plenário. A matéria é resultado de uma divisão dos termos relacionados à flexibilização da posse e do porte de armas e faz parte de um acordo entre os congressistas que permitiu a votação do PL 3723/19 – proposição que regulamenta o porte de armas para caçadores, atiradores e colecionadores. Apesar de haver um compromisso por parte do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, em pautar essa proposição com urgência, o PL ficou estacionado durante todo o ano.
No Senado, embora tenha havido avanços em 2019 (como a aprovação do PL 3715/19, que autoriza a posse de armas em toda a extensão das propriedades rurais), em 2020 o tema ficou parado na casa. “Sobre a flexibilização do porte e da posse de armas para o resto da população, realmente estamos em dívida. Após a revogação do decreto de armas, a bancada do PSL no Senado à época apresentou o PL 3713/19, que também flexibiliza a posse e porte de armas no país inteiro. Eu espero que em 2021 possamos dar a resposta que a população de bem espera e merece a respeito do direito de ter armas para se proteger”, disse a senadora Soraya Thronicke.
Haverá impacto na indústria nacional de armamento leve?
Os impactos irão depender, é claro, da extensão do que for eventualmente aprovado, se o for.
Para a IMBEL, por exemplo, que fabrica pistolas e fuzis, e para Boito, focada em espingardas, ambas direcionadas primordialmente ao mercado nacional, uma maior flexibilização das normas seria benéfica, pois traria um significativo aumento na demanda interna, principalmente por parte dos novos consumidores beneficiados por essa flexibilização.
No entanto, é preciso considerar que a IMBEL, apesar de ter demanda reprimida, atualmente não está conseguindo atender seus pedidos, haja vista não ter meios financeiros suficientes para produzir. Na intenção de resolver o problema, esta empresa está aprentando ao Governo e ao Congresso um grande plano de transformação chamado de "Nova IMBEL". Neste, estão inseridas importantes mudanças para ela e para o Setor de Defesa, inluindo a nacionalização e fabricação de alguns modelos de pistolas produzidos pela unidade americana da Sig Sauer, bem como sua futura condição de órgão certificador, desafogando assim o Centro de Avaliações do Exército e tornando mais ágil a homologação de produtos controlados pela Força Terrestre. Neste último sentido, a Nova IMBEL poderá se constituir em uma verdadeira "mão na roda" para a indústria de armamento leve.
A Taurus Armas, uma das maiores fabricantes de armamento leve do mundo, exporta cerca de 85% do que produz no Brasil, com ênfase nos Estados Unidos, maior mercado mundial desse tipo de armas. Nesse país, cuja demanda está com recorde histórico de aquecimento, possui backorders (pedidos já feitos) de cerca de 1,2 milhão de armas e, no Brasil, de 128 mil armas, o que corresponde a mais de 10 meses de produção a pleno.
Em síntese: mesmo que haja uma grande flexibilização nas atuais normas e que a Taurus garanta que sua prioridade de atendimento seja o mercado nacional, enquanto não efetivar seu plano de expansão de 50% na produção da unidade de S. Leopoldo, poderá ter dificuldades pontuais para atender novos pedidos relativos às armas atualmente comercializadas no Brasil.
Porém, há três novos fatores a considerar: o aumento de produção (ramp-up) na fábrica da Georgia, que poderá dobrar sua capacidade em 2021; os novos lançamentos da empresa, especialmente da pistola microcompacta GX-4; e o início da produção da unidade na Índia, em joint venture com o poderoso Grupo Jindal (Taurus Jindal).
Com lançamento simultâneo BR/EUA previsto para abril, a GX-4 é produzida na fábrica da Georgia (USA) e será exportada para o Brasil, tal como a TX-22. Essa inovadora arma tem tudo para se transformar em um dos maiores sucessos de vendas da Taurus, podendo vir a superar o recorde da G2c, a pistola subcompacta mais vendida no mundo (cerca de 2,6 milhões de unidades). Nos EUA, irá disputar um novo e importante nicho (microcompactas), ao qual a Taurus até agora não tinha acesso, estimado em 40% do mercado de pistolas. Suas grandes vantagens são a alta tecnologia embutida e um preço significativamente menor que o das demais concorrentes. No Brasil, encontrará um mercado virgem para o modelo e ávido por ele, sendo que os similares importados custam praticamente o dobro.
Além da importação da TX-22 e da GX-4, é bastante provável que as pistolas G3 (full size) e G3c (subcompacta), produzidas no Brasil e já comercializadas nos EUA, onde são sucesso de vendas, sejam liberadas em breve (pelo Exército) para o mercado nacional, haja vista que as solicitações de homologação foram feitas ainda em princípios de 2020.
Essas armas, além de atender a demanda já existente por parte dos CACs (caçadores, atiradores esportivos e colecionadores), poderiam também vir a preencher um aumento de demanda com origem nos consumidores beneficiados por novas flexibilizações, especialmente enquanto a empresa ainda estiver produzindo para atender os pedidos que já estão em carteira (backorders).
Por fim, a produção da Taurus Jindal ainda é uma incógnita, pois não se conhece os modelos de armas que serão fabricados na arrancada da empresa, assim como as quantidades envolvidas e a destinação dos produtos. No entanto, será mais uma unidade fabril com a marca Taurus no mundo. Aliada ao maior grupo do setor siderúrgico indiano (e um dos 10 maiores do mundo), estará em condições de começar a suprir o imenso mercado desse país e também a exportar para outros, inclusive para o Brasil, caso seja interessante e/ou necessário.
Voltando Brasil, é preciso considerar o cenário oposto, ou seja, mesmo supondo que nenhuma alteração venha a ser feita nas atuais normas brasileiras, ainda assim a Taurus seria beneficiada, haja vista que a demanda dos CACs e dos membros das forças militares e de segurança pública seriam suficientes para manter o mercado interno aquecido e, inclusive, absorver os novos lançamentos da empresa.
Para além fronteiras, o forte aquecimento do mercado americano, segundo fontes especializadas desse país, tende a se manter nos próximos dois anos (pelo menos), o que deve continuar pressionando a grande demanda pelos produtos da empresa nos Estados Unidos.
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