Análise prospectiva
Compilação e análise: LRCA Consulting – 07/10/2019 (atualizado em 08 Out)
Em sua live semanal no dia 03, o presidente Jair
Bolsonaro afirmou que o decreto editado nessa semana para regulamentar o acesso
a armas de fogo, ao flexibilizar as regras de importações de armas, acabou com
um monopólio, ressaltando ser este o fim da "restrição de importação
por similaridade", ou seja, a proibição de comprar no exterior um
armamento semelhante a um que já esteja no Brasil.
— É quebra do
monopólio. Também nós desburocratizamos o processo, e quem pode adquirir vai
poder importar. Então, você, cidadão comum, você pode comprar uma arma no
Brasil, vai poder comprar fora do Brasil.
Frente ao fato, as quatro associações e um sindicato que
representam as empresas da BID – Base Industrial de Defesa e Segurança do
Brasil emitiram uma nota conjunta à imprensa
no dia seguinte (04):
Importação sem isonomia fiscal e
regulatória na área de defesa e segurança ameaça empregos e soberania
A BID – Base Industrial de Defesa e Segurança
do Brasil gera 60 mil empregos diretos, 240 mil empregos indiretos e é
responsável por 3,7% do PIB nacional. No entanto, diante de uma série de acontecimentos
recentes, entendemos que essa Base está sob ameaça o que pode colocar em riscos
uma indústria geradora de empregos altamente qualificados, que gera altos
valores em tributos e que promove o desenvolvimento tecnológico, pesquisa e
inovação em nosso País.
A Indústria de Defesa de qualquer País tem seu
sucesso estruturado em três pilares básicos, a saber; investimento estatal em
desenvolvimento e encomendas tecnológicas, aquisições de produtos de Defesa
pelas Forças Armadas e órgãos de Segurança Pública e, sobretudo, de
Exportações. Neste sentido, a Estratégia Nacional de Defesa objetiva
institucionalizar em nosso país uma Política de Estado que favoreça a
consolidação da Base Industrial de Defesa Nacional, com vistas a garantia da
Soberania e projeção de Poder regional.
A excepcionalidade das regras da Organização
Mundial de Comércio –OMC, quanto à adoção pelos Estados Nacionais de Políticas
que favoreçam e protejam o desenvolvimento de sua Base Industrial de Defesa,
corrobora as decisões dos países de que a Indústria de Defesa deve ser
considerada de alto valor estratégico e, em razão disso, protegida e
incentivada.
Decisões em Políticas Públicas que favoreçam
importações generalizadas, sem a correspondente contrapartida de aquisições de
produtos brasileiros por terceiros países ou, que em encomendas tecnológicas
não garantam transferência de tecnologias, podem se constituir em avassaladora
ameaça para a sobrevivência da BID, com consequências negativas para a economia
e para garantia da Soberania.
Cabe aqui frisar também o problema da falta de
isonomia fiscal e regulatória: os importados são isentos de tributos contra uma
pesada carga tributária do produto nacional; a homologação dos produtos
estrangeiros importados em território nacional tem sido flexibilizada, com a
não observância das mesmas regras exigidas das empresas brasileiras.
A Base Industrial de Defesa e Segurança
entende que as indústrias estrangeiras são bem-vindas para produzir, gerar
empregos e concorrer em pé de igualdade com as que já estão estabelecidas no
país, de forma a proporcionar maior competividade tanto econômica quanto de
qualidade. No entanto, abrir o mercado com regras desiguais é condenar o Brasil
à desindustrialização e ao colonialismo tecnológico.
SIMDE –
Sindicato Nacional das Indústrias de Materiais de Defesa; ABIMDE – Associação
Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança; ANIAM –
Associação Nacional das Indústrias de Armas e Munições; ABRABLIN – Associação
Brasileira de Blindagem; APCE – Associação Brasileira de Produtos Controlados
Políticas
tributárias e regulatórias favorecem somente importações
Para ilustrar o problema, esta consultoria toma o exemplo da
Taurus Armas S.A., que, além de ser uma grande empresa de capital aberto que
tem seus dados e notícias amplamente divulgados pela mídia especializada e pela
imprensa em geral, é a empresa mais afetada pelas novas normas e pelas
discrepâncias tributárias e regulatórias.
Sendo uma companhia global, a maior fabricante de armamento
leve da América Latina e uma das maiores do mundo exporta 85% de sua produção
para mais de 100 países e, assim, está absolutamente preparada para enfrentar a
concorrência no Brasil e no exterior, pois compete com as maiores empresas de
armas nos mercados de exportação e, por este motivo, não tem razão alguma para
temer qualquer tipo de concorrência no Brasil, desde que haja isonomia
tributária e regulatória.
Uma simulação permite entender melhor a questão tributária.
Quando um cidadão compra uma arma, 70% do valor final são impostos e 30% é o valor do
produto. Numa arma que custa R$ 4200,00 no Rio de Janeiro, os impostos federais
e estaduais (IPI, PIS/CONFINS e ICMS) totalizam R$ 2.940,00. Subtraindo-se do restante o
frete de R$ 265,00 que a empresa paga, o valor que esta recebe é de apenas R$ 995,00,
por um produto que custou R$ 4200,00 ao consumidor.
Quando a arma é importada, não sofre a maior parte dessa
carga tributária, criando uma concorrência desleal e predatória com os fabricantes locais.
Hoje, as leis beneficiam unilateralmente as exportações de
armas para o Brasil e este tende a ser o sistema preferencial para as empresas
estrangeiras, já que não há vantagem nenhuma para virem se instalar aqui, pois
seriam tão penalizadas como a Taurus o é. Além disso, as empresas que exportam
para cá não geram empregos e divisas para o País.
Quanto à
questão regulatória (certificação de qualidade), para homologar um produto, se
não tiver mais nada na fila, a Taurus alega demorar de 18 a 24 meses para obter
a certificação junto aos órgãos competentes. Como a empresa tem hoje
mais de 100 novos produtos na fila, pela média dos últimos tempos iria demorar muitos
anos até homologar todos, o que significa expressivas perdas em oportunidades
de negócios, em competitividade e em inovação.
Claro que
isso é apenas uma perspectiva, pois certamente os órgão governamentais irão criar
mecanismos para agilizar o processo, como homologar laboratórios independentes
e simplificar o mecanismo, por exemplo. Caso contrário, em condições de acirrada concorrência com outras não dependentes desse processo, nenhuma empresa
sobreviveria a esse gargalo regulatório.
O
problema é que a agilização desse processo não é algo que vá acontecer no curto
prazo, diferentemente das importações, que começarão tão logo o Decreto passe a
surtir seus efeitos. O resultado tende, assim, a vir em total detrimento da empresa
brasileira.
Se uma
empresa vier fabricar armas no Brasil, terá o mesmo problema regulatório. No
entanto, as empresas que exportam para o País não precisam passar por nenhuma
homologação, o que torna a concorrência estrangeira ainda mais predatória, pois
elas conseguem, em seus países de origem, certificar novos produtos com muito
mais agilidade e rapidez.
Logística
pós-venda: um diferencial de peso
Um fato sobejamente conhecido neste mercado é a falta de
mentalidade de manutenção de grande parte dos consumidores normais brasileiros
e, até mesmo, de algumas entidades de segurança pública, fazendo com que as
armas apresentem problemas diversos por falta de manutenção preventiva
periódica e/ou após o uso diário em serviço. Segundo um documento do Comando
Logístico do Exército, de 2016, “Em algumas instituições de segurança existe
deficiência de política/gestão de manutenção preditiva, preventiva ou corretiva”
das armas.
Isso fez
com que a Taurus passasse a investir pesadamente na qualificação dos armeiros das
entidades de segurança pública e privada, bem como na de sua equipe de
representantes capilarizada por todo o país, procurando difundir a mentalidade
de manutenção.
Além
disso, a empresa oferece ao consumidor uma ampla e ágil rede de distribuidores,
pontos de venda e assistência técnica treinada em todo o território nacional,
além de uma equipe de instrutores credenciados e peças de reposição rapidamente
acessíveis, fazendo com que, no médio prazo, a empresa tenha vantagens difíceis
de superar por qualquer futura concorrência que venha, realmente, a se
estabelecer no território nacional, fabricando aqui suas armas e gerando
empregos e divisas para o Brasil.
Orgulho de ser uma empresa brasileira
Fundada em 1939 e sediada em São
Leopoldo-RS, a Taurus é uma das empresas brasileiras que mais exportou em 2018 no Estado.
Foram mais de 715 mil armas, entre revólveres, pistolas, fuzis,
submetralhadoras e espingardas exportados pela Taurus Brasil, totalizando mais
de U$ 132 milhões de dólares. A empresa contribuiu com a economia nacional
arrecadando R$ 155,2 milhões em impostos e gerando milhares de empregos.
"Make in Brasil" ou
"Make outside Brazil"?
Por mais que a posse de armas seja flexibilizada, é difícil
imaginar no Brasil a mesma liberdade encontrada nos EUA. Isto torna o nosso mercado
interno muito pequeno, o que faz com que uma indústria de
armamentos não se viabilize apenas no País.
Com 85%
da produção brasileira exportada, o movimento estratégico da empresa vai no
sentido de diversificar a presença internacional e depender menos dos EUA, país
que importa US$ 1 bilhão em armas por ano de diversos fornecedores mundiais. A
Taurus está mudando sua fábrica da Flórida para a Geórgia. Em parceria com o
governo local, está investindo US$ 42 milhões na unidade, o que a fará dobrar
sua capacidade nesse país.
A empresa
gaúcha é a líder mundial na fabricação de revólveres e a quarta marca mais
vendida nos EUA. A pistola G2c, produzida em São Leopoldo, é a mais vendida nos
Estados Unidos. No mundo, são 2 milhões de unidades comercializadas.
Desde o
começo do ano, a Taurus está participando de uma licitação internacional do
governo da Índia para, em sistema de joint venture com uma empresa
global do ramo siderúrgico indiano e dentro do conceito “Make in India”,
montar uma grande fábrica nesse país e passar a fornecer fuzis e pistolas para
abastecer o seu imenso mercado militar, paramilitar, policial e de segurança
privada.
Assim,
possuindo uma moderna fábrica nos EUA - maior mercado mundial para armamentos
leves - e com possibilidade de montar outra com todo o apoio do governo
indiano, a Taurus, apesar de todo o orgulho em ser brasileira, de empregar
milhares de brasileiros e de gerar divisas para o País, continua sendo uma
empresa privada de capital aberto e, como tal, necessita ser lucrativa e
remunerar seus acionistas, merecendo um tratamento isonômico do País para o
qual tanto contribui. Caso contrário, não haverá mais motivos para permanecer
no Brasil, podendo se transferir integralmente para o exterior, de onde poderia
exportar seus produtos para cá em condições mais vantajosas.
Ao fim e
ao cabo, caberá ao Brasil decidir se quer manter uma grande Empresa Estratégica
de Defesa que é fundamental para a segurança e para a autonomia do pais no
setor, que gera mais de 5 mil empregos diretos e 15 mil indiretos, além de
milhões de dólares em exportações, ou se irá permitir que políticas tributárias
e regulatórias equivocadas façam com que a empresa acabe deixando o País.
Ou seja,
enquanto a Índia fomenta o "Make in Índia", o Brasil irá
permitir o "Make outside Brazil"?
Quando a arma é importada, não sofre a maior parte dessa carga tributária, criando uma concorrência desleal e predatória com os fabricantes locais.
ResponderExcluirCom o máximo respeito, essa informação não é verdadeira. Os tributos mencionados IPI/ICMS/PIS/COFINS incidem também sobre os produtos importados. O que foi retirado foi o Imposto de Importação, equiparando o produto importado ao produzido aqui no Brasil.